
JOSÉ DIRCEU
Caberá ao poder Legislativo apreciar e acolher as medidas propostas pela presidenta, além de outras urgentes questões pendentes, para que se possa atender às reivindicações das ruas
A iniciativa da presidenta, Dilma Rousseff, de buscar um pacto com prefeitos, governadores e toda a sociedade, a fim de acelerar as mudanças em curso e oferecer uma resposta mais rápida às demandas apresentadas pela população nas manifestações que tomaram as ruas do país é louvável. Contudo, não se pode esquecer que é o Congresso Nacional o palco principal das mudanças.
Caberá ao poder Legislativo apreciar e acolher as medidas propostas pela presidenta, além de outras urgentes questões pendentes, para que se possa atender às reivindicações por melhores serviços públicos de Saúde, Educação, Transportes, Segurança e também por uma profunda reforma política, que seja capaz de reverter o sentimento de falta de representatividade e de insatisfação com as instituições manifestado por segmentos da sociedade.
Ciente dessa responsabilidade, o Congresso apresentou um conjunto de propostas a serem votadas com urgência na Câmara e no Senado. A chamada "agenda positiva" inclui, além da votação que levou ao arquivamento da PEC 37 e a da que aprovou 75% dos royalties do petróleo para Educação e 25% para Saúde, temas como o passe livre no transporte coletivo para todos os estudantes do país -- também por meio dos recursos dos royalties do petróleo destinados à Educação -- e propostas que tratam do Pacto Federativo, da Segurança Pública e da destinação de 10% do Produto Interno Bruto do país para a área da Saúde.
São questões importantes e é preciso canalizar a inquietação das ruas para a execução de reformas que não podem mais ficar sem resposta. Há muitas outras demandas que foram arrastadas e adiadas por pura e simples estratégia da oposição -- de prejudicar o governo --, mas também pela resistência de governadores e prefeitos que influenciam as ações dos congressistas de forma decisiva em muitos momentos. Foi assim, por exemplo, na apreciação anterior da proposição de 100% dos royalties do petróleo para Educação, rejeitada pela Câmara dos Deputados, e da que recusou a prorrogação da CPMF, mesmo com a inclusão no projeto da destinação total dos recursos arrecadados para Saúde via Estados e municípios.
O mesmo ocorreu em relação aos subsídios e à renúncia fiscal para viabilizar a redução das tarifas do transporte público. Enquanto o governo federal zerou as alíquotas de PIS/PASEP e Cofins incidentes sobre as empresas operadoras de transporte coletivo municipal rodoviário, metroviário e ferroviário de passageiros, não houve contrapartida dos Estados, devido à relutância dos governadores em promover a desoneração do ICMS do diesel e da eletricidade para o transporte público, o que permitiria maior redução da tarifa.
Dentre as reformas estruturais de que o nosso país precisa para continuar o processo de desenvolvimento, redução das desigualdades e inclusão social estão a tributária e a política, possivelmente, as que encontraram mais dificuldades de formar maioria para aprovação no Congresso Nacional ao longo dos últimos anos. A pergunta que não cala é: como se fará o pacto pela estabilidade em consonância com a necessidade de mais investimentos e recursos para Educação, Saúde, Saneamento e Transportes, sem fazer uma reforma tributária que inverta o a injusta conformação da estrutura tributária brasileira, mudando seu caráter social regressivo e reequilibrando a Federação? O Legislativo precisa nos dar essa resposta.
E quanto à reforma política -- item crucial do pacto proposto pela presidenta Dilma? Há anos o PT luta quase que solitariamente pela aprovação de uma reforma do sistema político e eleitoral brasileiro, cujo modelo atual mostra-se claramente distante das necessidades do povo e da nação. Mas as propostas -- dentre as quais a encaminhada pelo deputado federal Henrique Fontana (PT-RS), relator do projeto de reforma política na Câmara -- jamais encontraram consenso, sendo eternamente adiadas. Os motivos são os já conhecidos: a maioria não concorda com o financiamento público de campanha, instrumento fundamental para deter o domínio do poder econômico sobre a política; outros não querem o sistema de votação uninominal, que só persiste no Brasil, e muitos, simplesmente não querem mudar coisa alguma.
Além do projeto de reforma política do deputado Fontana -- que reúne medidas como o financiamento exclusivamente público das campanhas eleitorais, a unificação do calendário de todas as eleições, o fim de coligação em eleições proporcionais e o voto em lista flexível por meio de uma lista previamente apresentada por cada partido --, há a possibilidade de se fazer a reforma política via iniciativa popular, como defendido pelo PT, que está colhendo 1,5 milhão de assinaturas para encaminhar a proposta, e por entidades como OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral e a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).
Muito pertinente também é a intenção anunciada pela presidenta Dilma de pedir a opinião da população sobre a reforma política via plebiscito. É preciso colocar em debate os limites de nosso sistema político e tentar superar o esgotamento do modelo político-eleitoral -- ou mesmo institucional --, substituindo a atual forma de financiamento e representação política por outra, com mais participação popular. Precisamos defender nossas instituições democráticas, arejando-as e revitalizando-as, melhorando o diálogo com a juventude, com os movimentos sociais e toda a sociedade.
Precisamos também unir forças para defender as conquistas empreendidas até aqui e para seguir mudando e aprofundando as reformas iniciadas, fazendo as reformas política e tributária, indispensáveis para avançar nas melhorias sociais reclamadas pela população. O pacto entre os poderes públicos e a sociedade, invocado pela presidenta Dilma, e o acolhimento urgente das questões de interesse do povo pelo Congresso Nacional, sem dúvida, constituem o melhor caminho para dar esse passo adiante.
http://www.brasil247.com/pt/247/poder/106931/Congresso-Nacional-o-palco-das-mudan%C3%A7as.htm
http://www.brasil247.com/pt/247/poder/106931/Congresso-Nacional-o-palco-das-mudan%C3%A7as.htm